Durante os últimos 2 meses, o Infoproletários vêm denunciando as medidas que governo e empresas adotam para, durante a crise do coronavírus, manter a saúde financeira das empresas às custas da saúde e dos direitos do trabalhador. Exemplo disto é a Medida Provisória 936 (MP 936), criada por Bolsonaro, que, conforme comentamos em postagem anterior, permite a redução de salários durante a pandemia.
Diante disso, gostaríamos de chamar atenção para o papel negativo que alguns sindicatos que representam trabalhadores da área de tecnologia vêm exercendo frente aos ataques que sofrem seus representados. O Sindicato dos Publicitários de São Paulo, por exemplo, que representa profissionais como UX Designers que trabalham em agências de publicidade, assinou um acordo com os patrões onde, sob a justificativa de “evitar desemprego”, abre mão do reajuste salarial anual dos trabalhadores, além de validar todos os ataques presentes nas MPs 927 e 936 de Bolsonaro. Já o Sindicato de Processamento de Dados de Santa Catarina, que representa quem trabalha em empresas de software, sob a justificativa da “manutenção de postos de trabalho”, propôs à seus representados um acordo que, além de estender os ataques da MP 936 aos trabalhadores das faixas salariais não abrangidas pela medida, ainda permite que as empresas parcelem o pagamento de verbas rescisórias devidas ao trabalhador quando este é demitido, ou seja, facilita as demissões ao invés de preveni-las, sendo que o trabalhador que vai ficar sem renda por causa da demissão ainda terá que esperar para receber as verbas rescisórias, o seu dinheiro. Em outras categorias profissionais, a situação chegou ao ponto de chamar atenção do Ministério Público do Trabalho, que conseguiu uma liminar contra vários sindicatos que haviam assinado acordos que retiravam direitos trabalhistas sem ao menos consultar seus representados.
Ao analisar os acordos propostos e as explicações apresentadas por tais sindicatos, percebe-se que eles aderem ao discurso empresarial de que a única forma de salvar as empresas e, portanto, os empregos, seria sangrando os trabalhadores. Aos sindicatos, então, restaria apresentar aos seus representados o mesmo dilema cruel que lhes apresentam os patrões: ou aceitam a perda de direitos, ou perderão seus empregos.
Mas, por que há sindicatos que adotam esta postura? Será que sacrificar o trabalhador seria a única saída para a crise? É o que veremos a seguir.
Quais alternativas o trabalhador têm frente à crise do coronavírus?
A crise do coronavírus, do ponto de vista econômico, é semelhante às outras crises que afligem o mercado de tempos em tempos, no sentido de que desestimulam os empresários a investir. Em tais situações, assim como agora, o empresariado é rápido em reagir à crise demitindo e cortando salários. Porém, há outras saídas a serem consideradas.
Uma alternativa é o próprio Estado, que hoje é sustentado pelos impostos dos produtos consumidos pelos trabalhadores, defender os empregos durante a crise, seja via incentivos fiscais, oferecendo crédito às empresas ou mesmo arcando com custos da folha de pagamento. A nacionalização de empresas para que estas cumpram sua função social e mantenham os empregos também não estão descartadas, como fez o governo dos EUA com a GM e a Chrysler quando estas estavam falindo. O Brasil têm recursos para adotar tais medidas, principalmente se considerarmos a possibilidade da taxação de grandes fortunas (afinal, porque os pobres teriam que pagar pela crise dos ricos?) e também o fim do desvio de dinheiro para pagamento da ilegal Dívida Pública, que, em 2019, abocanhou quase 40% do orçamento da União.
Outra alternativa seria o controle dos trabalhadores sobre a empresa, como fizeram os trabalhadores da empresa Flaskô em Sumaré, que ocuparam as fábricas da empresa quando esta estava à beira da falência e continuam tocando a empresa até hoje de forma autogerida, mantendo os empregos e a renda dos envolvidos no processo.
É papel dos sindicatos lutar por essas pautas?
Muitos poderiam argumentar que tais saídas para a crise, onde aparecem exigências ao Estado, estão fora da alçada dos sindicatos. Nada mais falso. Afinal, o movimento sindical desde sua origem entende que, para melhorar a vida do trabalhador, a luta contra os patrões deve estar em conjunto com a luta contra o Estado. A origem dos sindicatos, que nascem entre os operários ingleses do séc. XIX, se confunde com o surgimento do movimento cartista, que consistia em uma lista de exigências do povo (como sufrágio universal e fim do trabalho infantil) ao parlamento inglês.
Além disso, a única força social que teria poder para pressionar os políticos, em sua maioria servis aos empresários, a adotarem medidas a favor dos trabalhadores seria a força dos próprios trabalhadores organizados. Recentemente na história do país, tivemos um pequeno vislumbre deste poder durante a paralisação dos caminhoneiros, que obrigou o governo Temer a mudar algumas de suas políticas. Mas a real força da classe trabalhadora em movimento, o Brasil pôde ver em momentos anteriores da história, como nas greves dos metalúrgicos do ABC paulista na década de 80, que se alastraram país afora e culminaram no fim da ditadura militar e de sua política de arrochos, ou então na Greve Geral de 1917, que conquistou direitos para o trabalhador brasileiro que perduram até hoje. Uma categoria de trabalhadores importante como a dos trabalhadores da área de tecnologia, capaz de parar tudo, tanto a produção quanto serviços importantes, têm um grande potencial para mudar os rumos do país se for à luta
É possível lutar por essas pautas no presente momento?
Sabemos que, entre os trabalhadores da área de tecnologia do país, especialmente entre os que trabalham em empresas privadas, prevalece a velha ideologia da direita de que é possível prosperar cooperando com a empresa e sendo um trabalhador competente, de modo que poucos consideram a possibilidade de se organizarem enquanto trabalhadores para fazer frente ao avanço dos patrões sobre os direitos trabalhistas. Muitos sequer enxergam estes ataques das empresas como ataques. Entre estes trabalhadores, não haveria sequer disposição para se filiar em sindicatos ou para fazer greve, quanto mais para aderir a um movimento mais amplo por direitos ou uma ocupação de fábrica.
Hoje, isto pode ser verdade. Mas não precisará continuar sendo verdade amanhã. Enquanto o trabalhador ainda não têm forças para resistir à perda de direitos que lhes é imposta, a melhor alternativa pode ser a de assinar um acordo “menos pior”, onde se percam poucos direitos. Entretanto, é dever do sindicato, que (supostamente) é composto pelos trabalhadores que têm mais consciência de classe, levar essa consciência para os demais trabalhadores, justamente para que haja condições para a luta no futuro. Um sindicato que não está junto dos seus representados para que estes possam lutar no futuro estará sempre assinando acordos rebaixados, atendendo mais aos interesses do patrão do que aos interesses do trabalhador.
Para que um sindicato avance na consciência de classe de uma categoria profissional, é necessário diálogo. E diálogo não se faz através de uma consulta online ou de uma ou duas assembleias por ano. Se faz através de troca de informações em contato direto com a categoria, ouvindo suas queixas, trazendo materiais informativos a respeito de questões pertinentes, da apresentação de contrapontos ao discurso ideológico empresarial, de estimular a criação de organizações no local de trabalho, enfim, do constante contato com os trabalhadores. Mas, para que isso aconteça, é preciso alterar a política dos atuais dirigentes sindicais.
O Infoproletários é uma organização criada por trabalhadores da área de tecnologia, majoritariamente empregados em empresas privadas, que sentem a necessidade de buscar melhores condições de trabalho para si e para seus colegas. Percebemos que os sindicatos de nossas categorias estão totalmente ausente de nossos locais de trabalho e de nossas vidas, deixando de cumprir o seu papel, e deixando um vácuo preenchido pela ideologia do patrão. Buscamos fazer todo o trabalho que eles deixam de fazer, informando e conscientizando os demais trabalhadores da nossa área para que possamos lutar em conjunto por relações de trabalho mais justas. Pretendemos pressionar os sindicatos para que atuem em favor das categorias que representam e expulsar os oportunistas das direções dos sindicatos, substituindo-os por trabalhadores conscientes.
Convidamos você para fazer parte desta luta.